Individualidade no casamento

Nossa, minha vida mudou radicalmente. Casei, agora não poderei mais jogar meu futebol. Tomar uma gelada com os amigos então, nem pensar, pois a primeira dama é osso duro de roer. Duvido que ela vai deixar eu sair. Mas não tem problema, eu também vou proibir ela de fazer muita coisa.

Por outro lado, a mulher pode pensar: poxa, nunca mais vou poder sair com minhas amigas, tomar uma gelada, bater um papo, saber das novidades, o que está acontecendo na vida delas. Pedalar, então, duvido que meu marido irá deixar, ainda mais com aquele monte de homem com a calça apertada. Duvido, mas eu também não vou dar moleza para ele. Afinal, estamos casados agora.

No dia a dia, vemos situações semelhantes às narradas anteriormente, levando a crer que o casamento é uma verdadeira prisão e que uma vez casados, adeus liberdade, por sinal, o bem mais precioso de ser humano. A questão é saber se precisa ser necessariamente assim?

A resposta é não. Mas a individualidade tem lugar no casamento? Pode acreditar que sim e deve ter, sob pena de as pessoas envolvidas no relacionamento viverem se chocando, conforme costumo dizer, saindo faísca para todo lado. Mas como se dá a individualidade no casamento?

Quando duas pessoas resolvem viver juntas, formando assim uma família, não há dúvidas que uma nova dinâmica de vida será inevitável, mas o que não precisa necessariamente é que ambas esqueçam e deixem de praticar aquilo que lhes é saudável, como por exemplo, jogar futebol ou se reunir com as amigas para colocar o papo em dia.

Mas e as tarefas da casa? Se o casal estiver bem sintonizado terão um planejamento para executarem as tarefas e ainda sobrar um bom tempo para as atividades individuais, mas isto requer muita maturidade e comprometimento de ambas as partes, pois a ausência desse requisito fará com que o outro sinta-se sobrecarregado – sobrecarregada sendo inevitáveis os conflitos.

Agora, preste atenção nesta história: Certa vez, um homem me ligou para ir urgentemente até a sua casa, mas não quis adiantar o assunto por telefone. Dirigindo-me até a casa deles imediatamente após o término da ligação, ao chegar, constatei se tratar de um briga de casal e o homem estava decidido, no calor dos acontecimentos, a separar-se da esposa, pedindo para eu, como advogado, tomar providências sobre a partilha dos bens do casal.

No entanto, percebi que, no fundo eles não queriam se separar, na verdade, precisavam fazer alguns ajustes, deixei o homem falar à vontade, adotando uma postura conciliatória, passando a ouvir as razões que o levaram a pedir a separação, quando me relatou ser a mulher muito ciumenta, sufocando-o, pois nem podia olhar no celular que ela já achava ser outra mulher.

Relatou também gostar de tirar momentos somente para pensar e refletir sobre a vida, ou melhor, ficar neutro, em um lugar calmo e tranquilo, sem conversar com ninguém, simplesmente silenciando sua mente, mas que sua companheira não o entendia, pois ela sempre achava ter algo errado.

Ao passar a ouvir a companheira que não queria de forma alguma a separação, ela reconheceu ser possessiva e ciumenta demais, por conta de algumas situações vivenciadas em outro relacionamento, mas que não pretendia em hipótese alguma, separar-se do companheiro.

Conforme os dois foram se acalmando, em especial o homem, utilizei de uma estratégia simples, porém poderosa, consistente em solicitar ao casal, que elencasse as qualidades um do outro, ouvindo da mulher ser o marido um homem maravilhoso, que não tinha o que reclamar, pois era trabalhador, honesto, dedicado, protetor, sempre estava junto com ela, os dois sempre decidiam as coisas juntos etc… O homem por sua vez, não hesitou em dizer ser a mulher parceira, honesta, fiel, trabalhadora, que adorava a comida preparada por ela, uma mulher memorável, registrando como único ponto negativo somente o fato de ela ser muito ciumenta, acusando-o a todo momento de estar falando com outras mulheres, ainda que ela tivesse livre acesso ao celular dele.

Por ser uma pessoa honesta, em especial com sua companheira, pois fiel a ela, o homem sentia-se injustiçado com as acusações que lhe eram feitas pela companheira, uma vez inexistir outra mulher, sendo tal fato fruto da imaginação e insegurança da mulher.

Nessa altura, os dois e principalmente o homem, estavam bem calmos e pude perceber ser a hora de dar o meu parecer sobre o caso. Nesse momento, disse aos dois em alto e bom tom, que não iria fazer separação de ninguém (confesso que até usei um palavrão), para impactar os dois, e que eles precisavam apenas ajustar a relação.

Perguntei à mulher se reconhecia seu comportamento sufocante oriundo do ciúme, ela disse que sim e que faria de tudo para ser melhor nesse ponto. Ao marido, perguntei se havia deixado claro para a esposa que gostava de ter momentos somente seus para refletir sobre a vida, como sendo de sua individualidade, respondendo ele que não, esclareci sobre a importância da esposa saber sobre tal fato.

Resumindo, consegui fazer os dois se abraçarem antes de ir embora, ele um pouco resistente ainda, mas o fato é que eles estão juntos até hoje e boto fé naquela relação.

O caso acima serve de parâmetro para você pensar um pouco sobre a necessidade da individualidade no casamento e, principalmente, de conhecer muito bem o companheiro – companheira, evitando assim situações conflitantes desnecessárias, desencadeando, em alguns casos, a separação.

O casal deve sim ter seus objetivos de vida em comum, como formar a família, quantos filhos terão, onde morarão, se irão viajar uma, duas ou três vezes ao ano, se as viagens serão nacionais ou internacionais, se terão apenas um ou dois carros, que farão a administração financeira juntos ou não, o valor individual que cada um terá todos mês para usar como bem entender e assim por diante.

O que não se deve esquecer, é a individualidade de cada um e que este fato não é capaz de prejudicar o casamento, quando as atividades são de conhecimento do outro cônjuge ou companheiro e realizadas com equilíbrio. Liberdade demais não é bom, fiquem atentos. Registro que não estou aqui a falar da pessoa que vai para o bar beber uma com os amigos -amigas, e se esquece de ter uma família. Esquece ter se casado.

Com questionamentos, diálogos, equilíbrio, responsabilidade, é possível viver em plena harmonia no casamento, vivendo feliz, dando ótimos exemplos aos filhos e construindo uma vida à dois exemplar.